This is what we all want and need
- to feel like women again!
Com toda a sinceridade, tenho alguma dificuldade em aceitar a relutância de certas pessoas no que toca a conversar sobre qualquer assunto relacionado com o cancro da mama.
Esta minha história vai com três anos e meio, e a falta de disponibilidade demonstrada por várias pessoas do meu passado para me ouvirem e para dizerem de sua justiça tem-me feito sentir uma criatura solitária, apesar de aqueles que sempre estão prontos para mim serem do melhor que há.
Se este problema atingir algumas das pessoas que nunca "conseguiram" ouvir-me, o que acontecerá a seguir? Acabará o mundo, para elas? Fechar-se-ão num quarto, para não verem ninguém, e recusarão qualquer forma de comunicação? Deixar-se-ão morrer, sem lutarem pela vida? Ou terão necessidade de falar com o mundo, especialmente, talvez, com quem já passou pelo mesmo?
Na possibilidade de a reação ser a enunciada por mim em último lugar, o que sentirão essas pessoas se o mundo não se mostrar recetivo a essas suas necessidades?!... Julgo que bem não se sentirão!!!
Para início de enunciação de princípio, penso que todas as pessoas deviam olhar para qualquer doente como alguém que sofre de algo de que elas poderão vir a sofrer. Continuando, defendo que todos devemos apelar à nossa capacidade de abstração, esforçando-nos por nos colocarmos "na pele" dos que sofrem a nosso lado, por forma a conseguirmos agir com eles como gostaríamos que agissem connosco, se fôssemos nós os enfermos.
Concluindo, não posso deixar de realçar a importância da procura do conhecimento exato daquilo que o doente gostaria que fizessem (ou não fizessem) por si, para que se possa agir em conformidade.
Ora detenhamo-nos só um pouco no meu caso de cancro: notícia; comunicação da notícia aos pais, aos filhos pequenos...; mastectomia, mais cinco cirurgias: 1. por rompimento do expansor, quando picada para me extraírem o líquido de um seroma; 2. para troca do expansor por uma prótese de silicone e redução da mama contralateral; 3. para colher um pouco de tecido na mama contralateral e formar uma aréola na mama nova, para que pudesse ser tatuada; 4. histerectomia, devida aos efeitos secundários do Tamoxifeno nos ovários, no útero e no colo do útero; 5. Tram Flap, para acabar de vez com tudo o que tinha sido feito anteriormente e me causava aperto, dor, mal-estar e falta de qualidade de vida, mas muita gente considerava ser produto da minha mente stressada e ansiosa; quimioterapia; radioterapia; fisioterapia; depressão e tratamento psiquiátrico; hidroginástica; consultas de psicologia e hipnose, para tentar aprender a viver com dor; férias familiares em casa...
Não haverá aqui matéria suficiente para necessidade de conversar? Só encontrei essa possibilidade nas meninas que já passaram por algo semelhante, as quais encontrei via net e a quem já me sinto ligada de uma forma muito especial. Contudo, a falta de "colo" das minhas pessoas de sempre e das outras de há muitos anos deixou-me à nora, sem referências, e fez com que houvesse uma grande transformação na minha essência.
Neste momento, falta-me recuperar do Tram Flap e fazer a aréola e o mamilo. Ai, mas que impressão faz a tanta gente falar (ou até ler) sobre estas questões!...
Mas nós, as "ganguinhas da mama" estamos à vontade até para mostrar...
"Naturalmente" - dirão alguns! Claro - digo eu. Mas não é natural não haver esforço da parte de amigos..., pois amigos são pessoas que se revelam nas ocasiões difíceis, procurando transcender-se nas suas dificuldades, se tal for necessário para ajudar... Amigos não podem ser, seguramente, aqueles que nos dizem que nós temos de pensar que não somos os únicos a sofrer e que todas as pessoas têm problemas, coisas que nem nos passam pela cabeça. Não passarão, talvez, mas, sem que no-los revelem, não podemos adivinhá-los, muito menos ajudar... E por que é que há-de ser praticamente um crime demonstrar as nossas fragilidades a quem pensamos ser nosso amigo?!... :(
4 comentários:
Comungo inteiramente com o que é dito por si, Guida.Para muita gente, inclusive técnicos de saúde, o cancro é uma doença tão assustadora que falar dela à vontade é desconfortável. A toda a gente pode ocorrer mas enquanto isso não acontece afastar-se de tudo o que for relacionado com a doença "faz com que ela não exista".
Aprendi que esse é um tema que só é tratado com pessoas muito especiais, aquelas que se revelaram ser mesmo amigas e fortes emocionalmente para poderem ajudar-me a banalizar esta fase tão difícil...
Guida, o seu período difócil já passou... Numa mulher bonita e interessante, umas cicatrizes só podem torná-la mais expertiente e humana.
Beij.o
Conceição
Olá, Conceição!
Às vezes, sinto-me mal por me aperceber de que estou a exigir que os outros deem atenção ao meu problema, mas, outras vezes, a minha fragilidade está tão à flor da pele que não aguento sem exteriorizar alguma incompreensão pelas ausências e pelos silêncios prolongados...
Mesmo com a parte oncológica controlada, uma mulher vítima de cancro da mama não volta a ser o que foi e sofre muito enquanto a vários níveis não se reconhece...
Bem haja pelas visitas, pois fazem-me muito bem.
Não sei como está, mas desejo-lhe o maior dos sucessos.
Mil beijos
"Amigos não podem ser, seguramente, aqueles que nos dizem que nós temos de pensar que não somos os únicos a sofrer e que todas as pessoas têm problemas, coisas que nem nos passam pela cabeça. Não passarão, talvez, mas, sem que no-los revelem, não podemos adivinhá-los, muito menos ajudar... E por que é que há-de ser praticamente um crime demonstrar as nossas fragilidades a quem pensamos ser nosso amigo?!... :("
CONCORDO!
Tenho uma amiga que me pediu para quando estivermos juntas eu não lhe falar do cancro, para deixar essas conversas para as minhas sessões com a psicóloga...
Embora tenha apreciado a sinceridade (apreciei mesmo!), acho insuportável este determinismo das pessoas. Eu também não lhe digo: "estou farta de te ouvir queixar do estúpido do teu namorado".
Acho que as pessoas se esquecem muitas vezes que ser amigo é estar lá, é ouvir. Não é manipular os outros e as suas conversas para se passar momentos agradáveis no café.
*desabafo mood* lol
Um beijinho*
Silvina,
Acertaste em cheio no cerne da questão: "manipular os outros e as suas conversas para se passar momentos agradáveis no café." É assim que funciona o meu grupo de amigos da adolescência, um clã numeroso em que quem começa a evidenciar a sua individualidade e a manifestar-se diferente é habilmente segregado. Vivo há 12 anos a 300 quilómetros deles, mas fui mantendo o contacto, pois há muita afinidade entre os nossos filhos, que são primos e primos de primos... Mas, a partir do momento em que o meu cancro deflafrou, iniciou-se uma separação que muito me fez sofrer, pois a minha forma de abordar o assunto perturbou o bem-estar dos momentos de convívio, que são vividos na galhofa, a um nível de superfície, tentando passar ao lado dos problemas da existência...
Beijão
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