(Tram Flap não é igual a Apendicectomia, nem a Cirurgia da Próstata, nem a Cesariana, nem a Abdominoplastia, nem a Histerectomia...!)
As intervenções medicamente assistidas a que eu já me submeti, ao longo da vida, têm os seguintes nomes, por ordem de ocorrência:
amigdalectomia - 1968
apendicectomia -1989
parto normal, com epidural - 1995
parto normal, com epidural - 1997
2 amniocenteses - 1998
2 partos normais, com epidural - 1999
mastectomia e mamoplastia para colocação de expansor - 2008
mamoplastia, de urgência, para troca de expansor rebentado - 2008
mastopexia e mamoplastia para retirada de expansor e colocação de prótese - 2009
mastopexia e mamoplastia para recolha de retalho e colocação de aréola - 2010
histerectomia e anexectomia bilateral - 2011
tram flap - 2011
Uma realidade sobre a qual não posso pronunciar-me com conhecimento de causa é a cesariana, mas quase tenho pena de não ter essa sabedoria, pois já tanta gente comparou o meu tram flap com a sua cesariana ou com a cesariana de outrem...
Genericamente, as pessoas têm tendência a fazer comparações e a fazê-las de uma forma impensada, pois é comum a noção de que já se viu e ouviu muito, pelo que... já se sabe do assunto.
Eu sei que, provavelmente, eu agiria do mesmo modo, se nunca tivesse sentido agressões físicas mesmo incomodativas, mas já que é impossível chegar a qualquer certeza quanto a isso, gostava mesmo que as pessoas que me interrogam o fizessem porque querem mesmo saber e não para me mostrarem que já têm experiência na matéria, seja por que forma for.
O meu cancro não me parece estar a tornar-me a pessoa melhor que eu me convenci que iria ser. Porque estou intolerante à intolerância dos outros: os que não querem falar; os que me abandonaram; os que sabem bem (mal) o que eu passei e estou a passar...
Há muita gente para quem os cancros são todos iguais e as cirurgias, com os seus períodos pós-cirúrgicos, também. Perante isto, eu sinto-me não mais do que um objeto, igual a tantos outros, de quem já todos sabem tudo.
E mais: cirurgias e pós-operatórios (e até químios e rádios) são banalidades da existência!...
Bem, vivo neste momento o pós tram flap, e, daqui a alguns meses, farei a aréola e o mamilo, a partir da pele da parte interna da coxa, junto à virilha.
Neste momento, o aspeto da minha mama é o que se vê na foto; uso uma cinta muito apertada, igual à da imagem (por 2 meses, de dia e de noite) e tenho uma cicatriz como a apresentada, com 54 cm. O meu umbigo não é o mesmo (foi-se a marca da ligação física que tive com a minha mãe), foi construído.
A mama nova saiu toda da barriga e o músculo abdominal subiu, por dentro, até à mama, sendo ele que a alimenta. No lugar dele, na zona abdominal, está uma rede, para im-
pedir que os órgãos se atrapalhem na escolha das suas posições corretas...E agora vou referir aquele aspeto em que alguém que esteja a ter pachorra para ler isto já estará a pensar: "Mas porque é que ela expõe isto tudo?"
Exponho porque preciso, criando a ilusão de que me leem e me entendem, com intenção de dividir todos os tipos de dor que tenho tido nestes três anos e meio, fingindo acreditar que isto é partilhar a vida e, assim, torná-la menos dura; exponho por absoluta necessidade de verbalizar aquilo que as pessoas me mostram que é maçador quando ouvem; exponho, talvez, com a mesma necessidade que outras pessoas têm para esconder, calar.
A Educação para a Saúde devia conter uma unidade de Educação para a Doença, onde se aprendesse, em primeiro lugar, que cada doente é um ser humano diferente dos outros e que devemos saber como é que ele prefere ser tratado por nós no seu período mau...
Para finalizar, refiro que, de todos os "pós" que já vivi, este é o que me está a custar mais, pela violência da intervenção abdominal, que deixa no corpo a sensação de que nos encheram excessivamente, como se faz com uma mala (apesar de que o que aconteceu foi esvaziarem) e forçaram a pouco elástica tampa da mala a fechar...
Quanto à mama, não há dor nem desconforto. E foi-se o horrível mal-estar que tive durante 3 anos!
9 comentários:
Bom....e o prémio das intervenções vai para a Guida!!
Falando agora a sério....só quem passou por essa planópia de intevenções pode saber o que é. As pessoas que querem comparar casos devem: ou ter inveja (realmente és uma supermulher, devem pensar) ou pensar que assim vão ser o centro do mundo!! Onde já se viu comparar o que não é comparável.
Deixá-las andar...Tu que já passaste por isto tudo não te aborreças mais com comparações e que tais!
O importante é que finalmente estás aliviada....e o bicho já era!!
Bjs grandes!
É verdade....e todos estes pormenores vão ajudar outras mulheres que passam ou passaram pelo mesmo.
Vocês, mesmo sem quererem, ficam umas experts e podem e devem partilhar estas experiências.
Olá Guida
Obrigada por partilhares todas essas experiências, de certeza que vai ajudar alguém que se encontre em vias de fazer o mesmo.
Fico muito feliz, por já não teres aquelas dores horríveis:)
Espero que a recuperação seja rápida e que esses efeitos passem depressa!
Quanto à cesariana, eu fiz duas e também fiz a histerectomia, e posso afirmar que os efeitos/cuidados pós cirurgia que tive, nas três foram precisamente os mesmos. Por isso não vejo nenhuma comparação com o que estás a passar, mas enfim, as pessoas gostam de banalizar e por vezes só questionam para puderem falar delas!
Acho que fazes muito bem em lavar aqui a tua alma:)Este espaço é teu e podes escrever o que quiseres.
jokas
Oi Guida. Você tem toda a razão de se revoltar. A falta de solidariedade das pessoas é chocante e magoa muito, principalmente quando elas agem como se soubessem o que o outro está passando. Você passou por coisas muito difíceis e estes últimos 3 anos foram uma verdadeira guerra para você. Passei por muito menos (mastectomia da mama direita, esvaziamento axilar direita, quimio-6 e radio-28, agora vou retirar a mama esquerda e tirar o expansor por uma prótese definitiva) e já acho difícil, é um dia após o outro para dar conta. A coisa que mais ouço é que a mastectomia é o mesmo que colocar protese estética, e já fico possessa. Eu sou do tipo que não fala, por isso agradeço a você pelas palavras, que faço minhas.
Você tem razão de enraivecer e continue usando o seu blog para desabafar quem sabe as pessoas aprendem alguma coisa ao le-lo. Eu sei que aprendo muito e torço por você mesmo sem você me conhecer e pode ter certeza que muitas outras pessoas também torçem mesmo sem você saber.
Grande abraço.
Regina Castilho das Oliveiras - Brasil - Brasília
Eh, eh, Isalenca, obrigada pelo prémio! E pelas palavras doces.
Eu sei que tenho de me deixar deste tipo de queixumes, pois nada muda, mas ainda não purguei tudo, é o que é. Lá chegarei. :)
Beijinho
Gatapininha,
Obrigada por aceitares aquilo que escrevo, que é de todo o tipo, por vezes até mal-humorado... É muito bom saber que há quem perceba que às vezes nos apetece mandar tudo às urtigas, sem que isso queira dizer que não gostamos de alguém e sem que nos excluam logo do rol.
Beijoca
Regina,
Obrigada por ter escrito para mim.
Você também já passou por muito, que eu bem sei o que isso é. E ainda vai passar mais um pouquinho.
Desejo que tudo lhe corra da melhor maneira. Infelizmente, ainda não tenho solução que lhe aconselhe para o caso das comparações, pois, não querendo ser mal educada, torna-se difícil. Eu vou escrevendo, mas há quem não goste....
Não há dúvida de que há vários aspetos tristes relacionados com a nossa doença, aspetos que nunca imaginaríamos se não passássemos por ela, mas tenho a certeza de que o que sobrar vai ser do melhor!
Mil beijos
e volte sempre
Ola Guida, gostei deste post. Também não gosto de comparações, e também as oiço o tempo todo (até vindo dos meus pais). Chateia e magoa, é como se não entendessem que a nossa dor é única. As experiências por que passamos são, também elas, únicas. Claro que é reconfortante saber que mais alguém passou pelo mesmo, partilhar, falar das coisas. Mas só é bom quando isso é feito com sinceridade e respeito; afinal, não estamos aqui para dizer "a minha maleita é pior do que a tua"... Para terminar com uma ponta de ironia, eu também fiz um flap (mas não foi Tram, foi fibula free flap :PP)
Olá, Silvina.
Sê bem vinda a este blogue. Penso que ainda não te conheço, mas considera-te da casa. É mesmo bom partilhar as nossas dores (sejam elas de que tipo forem) com alguém que as entenda. Aliás, penso que essa é a única maneira de conseguirmos uma espécie de alívio, pois, desse modo, estamos a dividir um mal que, por partes, conseguimos gerir e aguentar muito melhor.
Aparece sempre que te apetecer.
Um beijo
P.S. Fui ver o que é concretamente o 'flao' que tu fizeste e pareceu-me que já tiveste aí uma boa conta, sua valentona! :)
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