segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010
Mas onde é que andam todos?
Na minha infância, tive um sonho recorrente que consistia em tocarem à minha campainha e, depois de eu abrir a porta, deparar-me com um paralelepípedo de mármore que tapava todo o espaço da saída, o qual era impossível de arredar e configurava a minha situação de prisão dentro de casa. Ainda no sonho, para remédio dessa circunstância penosa, aparecia-me a hipótese de pegar no intercomunicador e, através dele, pedir ajuda a algum transeunte que me ouvisse no passeio. E era isso que eu tentava fazer. Mas, da minha garganta, não conseguia sair qualquer som que me anunciasse. E, invariavelmente, acordava em aflição, sem perceber porque se repetia aquela tortura.
Hoje fui a uma consulta de fisiatria, a terceira no âmbito do meu processo de regeneração da pele e do músculo peitoral, que revestem o implante de silicone que forja a mama direita em mim. A dor que sinto na "mama" define-se por um aperto, o qual não tem diminuído de intensidade, apesar das muitas sessões de fisioterapia a que já me submeti. Contudo, ao toque, a pele já desliza sobre a prótese e a dor já não provoca lágrimas. Aparentemente, temos aqui um contrassenso, pois se a fibrose já está em regressão e/ou a pele já ganhou alguma elasticidade, o mau-estar do dia-a-dia devia estar aliviado. Mas não está. E porquê? Por muitas razões, talvez, entre as quais a dor psicológica de tantas vezes não terem ligado à minha descrição desta dor, insistindo que eu estou óptima.
De certa forma, estou presa dentro de mim, como, no sonho, o estava dentro de casa - pois quem para mim olha vê uma pessoa de aspecto normal, que se movimenta, fala, ri, caminha...; de certa forma, eu, que sempre quis explicar esta dor, nunca encontrei compreensão; e, de certa forma, eu, que sempre quis partilhar a minha doença, para meu alívio (libertando carga...) e para dar a conhecer modos de a evitar e de minorar o sofrimento dos tratamentos, não encontro receptividade.
Estou a viver o que sonhava na infância: se alguma mensagem sai da minha boca ou se forma a partir da minha composição em teclas, a verdade é que não há transeuntes que me ouçam no passeio, ou, se os há, têm sido indiferentes à minha necessidade de partilha.
E o fisiatra aconselhou-me hoje a não sair de casa apenas para ir aos vários médicos e às várias terapias. Acha ele que eu devo sair com as minhas amigas...
Episódios:
Partilhar a Doença,
Reações Alheias,
Reconstrução Mamária,
Solidão
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4 comentários:
Pois se queres, podemos combinar e ver horários e ir tomar um chá, que tal? Escolhe o local.
Laura:
Que tal? Parece-me muito bem. Estou até já a pensar nuns "Sabores" que há ali em frente da Vilabeira...
Combinemos!
Eu ia tomar café contigo, mas estou um pouco longe. De qualquer forma, ando por aqui e leio-te. Por vezes não tenho é grande coisa para acrescentar. Mais para aprender, na verdade.
Beijo
Sabes, Meireles, ultimamente ter-me-ia sido agradável conhecer um meio de reduzir quilómetros a centímetros!...
beijos
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