O tempo passa sobre os acontecimentos e, naturalmente, o interesse alheio sobre eles vai diminuindo, pois as rotinas diárias absorvem em excesso a atenção que é necessário oferecer-se a centenas de pormenores. É a vida a continuar, depois de um período em que se andou com uma ideia na cabeça, daquelas persistentes e impressionantes, que nos fazem (querer) agir em conformidade.
Senti na pele a ausência da "chuva" gostosa de carinhos vindos de todos os lados, mesmo daqueles que mais resistiram ao contacto por não saberem como agir e o que dizer.
Mas não me isolei. Procurei aquilo que já não vinha, fazendo visitas aos colegas, no local de trabalho, e combinando cafés e almoços com amigos.
Nessa altura, verem-me era, para todos, de certo modo, estranho, pois eu estava careca e pálida, devido à quimioterapia, mas sempre ouvia dizer que estava com bom aspecto, "melhor agora do que na última vez que te vi", apesar de as fotografias desse tempo atestarem o meu ar de doente.
Até que eu cheguei a um período de falta de vontade de procura, de propostas feitas por mim. E os contactos com gente fora de casa começaram a intensificar-se via net, numa rodinha de gente conhecida mas distante, que ia correspondendo a desafios da vida normal e me fazia sentir ocupada, mas quase sem tocar no assunto que me mantinha em casa, de baixa.
Ninguém se esqueceu de mim, mas era evidente que já tinha passado o período do choque, da curiosidade e da disponibilidade para gestos amáveis. E todos me diziam que o pior já tinha passado, sem eu perceber bem a que se referiam... Ao cancro, que já não tinha, mas, quando tinha, não me incomodava minimamente? Às operações? Ou seria aos pós-operatórios? É que a quimio e a rádio, de modos diferentes, custaram muito mais do que o embate inicial (tanto a consciencialização da doença como os pós-operatórios) e a verdade é que tive muito mais mimos na fase que menos me custou. Ou terá sido por isso que foi a que menos me custou?!...
sexta-feira, 22 de janeiro de 2010
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2 comentários:
Identifico-me com este post, vou ser operada brevemente e sinto o MESMO.
Bjs.
Boa sorte, Maria. A todos os níveis. E um beijo.
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